Pai & Filha I

Ficamos perdidos em nossos olhares, deitados lado a lado sobre a cama por dezenove minutos e cinco segundos, quando minha namorada lembrou:

– Se eu pudesse passava o dia todo com você aqui! Mas acredito que a Suzy ligou para a fazenda avisando da nossa ida hoje. É melhor nos arrumarmos. Visitas só são permitidas até às cinco da tarde. Quero aproveitar o máximo de tempo com o meu pai.


Decididos a sair da cama, nos sentamos e a abracei por trás com ternura prolongando nosso contato ao máximo. A mulher amada procurou por mim com o olhar e disse:

– Quero te agradecer por me mostrar a beleza do amor. Eu tive todo tipo de experiência... Me senti suja por muito tempo pelo que aconteceu comigo. Mas em seus braços me reconstruí pura e limpa. Passei a me sentir bela e amada.


A nossa primeira vez foi sublime e única, simplesmente por nos entregarmos e compartilharmos amor. Repliquei dizendo não haver motivos para agradecimentos, era muito importante apenas saber ter-lhe feito o bem. Expressei minha gratidão buscando seus lábios em um gesto de afeição e carinho.


Logo após nos aprontarmos, descemos as escadas para a sala de jantar e encontramos Suzanna a nossa espera. Informou-nos sobre tudo estar preparado para nossa pequena viagem até o Vale. Como a minha criadora havia previsto, ligou na tarde anterior e avisou sobre a nossa visita.


Em seguida, olhou para mim e perguntou:

– Senhor Humane, qual é sua preferência para o desjejum?


Ella respondeu por mim:

– Não se preocupe, o que você fez para mim serve para o Adam também, Suzanna. Ele não tem preferências, come de tudo. – Eu realmente não tinha e meneei a cabeça concordando com as palavras da minha namorada.


Suzy acatou sua sugestão somente quando notou a minha concordância. Apontando para a sacola e caixas na mesa de canto, questionou:

– Reparei nestas compras aqui embaixo. São para o seu pai? Se forem eu peço ao George para colocá-las na mala do carro.


Na noite anterior, preferimos deixar as compras no cômodo. A mulher amada explicou o acontecido dizendo:

– Eve tem muita sorte por ter você trabalhando aqui! Parece adivinhar cada ato e pensamento nosso. São para o meu pai sim, obrigada por tudo Suzanna.


A governanta ficou entusiasmada com o elogio sincero e deu seu parecer:

– É só o meu trabalho Dona Ella, amo trabalhar aqui e o que faço.


Depois de seu pronunciamento, saiu da sala com um sorriso no rosto e voltou com nosso desjejum em quatro minutos e trinta e três segundos. Era uma bela torta de nectarina, iria fornecer as calorias necessárias para sustentar a minha namorada até o almoço.


Terminamos a refeição em vinte minutos e doze segundos. Não nos demoramos muito para seguirmos até a garagem. George estava nos esperando dentro do carro. Sentei-me a frente ao lado dele, como a minha criadora havia sugerido. Estava empolgado para apreciar toda a vista durante o percurso.


Partimos às nove horas, doze minutos e quarenta e dois segundos da manhã. Seguimos por uma estrada vicinal por uma hora, vinte e um minutos e quatorze segundos. Vi poucos carros e alguns caminhões na estrada, a paisagem era muito diferente da Ilha, as árvores eram de outro tipo e pequenas casas eram vistas muito distantes uma das outras. Por fim paramos em frente à Fazenda do Vale.


A mulher amada abriu a porta e ouvimos George declarar:

– Dona Ella, deixa os presentes que eu levo. Tem que passar pela inspeção antes e sei que a senhora está saudosa do seu pai. Volto às cinco em ponto para pegar vocês. – Minha namorada agradeceu feliz a sugestão e entramos.


A sala de visitas era simples, contudo bem arrumada. A recepcionista nos olhou curiosa de sua mesa. Era uma bela jovem de cabelos castanhos presos de modo displicente, seus olhos azuis muito claros sobressaíam por trás de seus óculos discretos. Ao se levantar com um sorriso no rosto, falou:

– Ella, quanto tempo! Fiquei feliz quando me avisaram de sua visita hoje, não falei nada com seu pai. Ele vai gostar da surpresa.


– Anne, você é incrível, nem sei como se lembra de mim, venho tão raramente! George vai entrar com os presentes que trouxe para o papai. Quando liberarem, você me chama para entregar?


A moça respondeu com carinho e suavidade na voz:

– Como poderia esquecê-la, Hector tá sempre me mostrando o seu álbum de infância. Ele te ama muito! Quanto aos presentes, pode ficar tranquila, assim que liberarem mando te chamar. Seu pai tá na plantação com os outros, vai lá.


Quando viu a filha, Hector abriu um sorriso largo e se levantou para abraçá-la dizendo:

– Que surpresa boa, docinho! Imaginei que viria este mês, mas não tão cedo.


O amor dos dois era latente e fiquei feliz por presenciar a cena. Os dois se afastaram com dificuldade após dois minutos e doze segundos, só então ouvi a voz da mulher amada:

– Ah pai, tava morrendo de saudades de você! Tenho um monte de novidades para contar. E tinha que ser pessoalmente, não dava para ser por carta.


Ele estava muito animado ao falar:

– Deve ser muito bom, pois há muito não te vejo tão bonita e alegre!


Olhando para mim com um sorriso estampado no rosto declarou:

– Acho que você tem parte de culpa nisso meu rapaz!


Ella não me deu oportunidade para responder e disse:

– Adam fez toda a diferença em minha vida papai, mas esta história preciso te contar em um lugar mais reservado. Podemos ir ao seu chalé? – Hector acenou afirmativamente com a cabeça e os dois me convidaram a acompanhá-los.


Por um segundo analisei a situação. Minha namorada contaria cada detalhe sobre a minha origem ao seu progenitor. Não poderia esconder um segredo desta magnitude do seu próprio pai. Eu estava preocupado com a reação dele a minha presença e a minha existência. Entretanto, a minha maior preocupação era da sua interpretação em relação ao nosso amor.