Um Dia de Sol IV

As sensações provocadas pelo contato com a sua pele praticamente descoberta e pelo sabor inebriante do seu beijo estimulavam o funcionamento do meu novo dispositivo. Afastei-me rapidamente ao primeiro sinal, olhei para Ella temeroso, porém seu sorriso me tranquilizou e voltei a me deitar ao seu lado.

Trouxe-a de volta aos meus braços, após repousar minhas costas sobre a toalha. Desejava entender o motivo de estar tão aberta e disposta para os meus beijos. Descobrir se os meus sentimentos estavam sendo correspondidos. Com minhas esperanças renovadas, estudava um meio de entrar no assunto sem a pressionar ou ofender.

Dez segundos de hesitação foram o suficiente para a nossa amiga, já vestida, se aproximar dizendo:

– Vocês formam um casal muito bonito! Uma pena, eu os interromper... Mas acho que três horas sozinhos devem ser o bastante. Agora, podem dar um pouco de atenção a uma pobre amiga solitária.

Ella e eu nos levantamos rapidamente, sob o seu olhar displicente. A artista merecia mais cortesia da nossa parte, a negligenciamos desde o meu banho na cachoeira. Passava da hora de demonstrarmos nosso apreço por sua companhia.

Enquanto nos sentávamos, minha criadora alegou:

– Você que foi nadar sem nós... – Havia pouca convicção em sua voz ao pronunciar as palavras e seu rosto ganhou um delicioso tom rosado.

Embaraçado com a minha conduta, olhei para Eve e me justifiquei:

– Estávamos distraídos, espero que possa nos desculpar e se unir a nós. – Em seguida me afastei dando espaço para nossa amiga sentar sobre a toalha.

Conversamos por mais uma hora, vinte e três minutos e quarenta e oito segundos. O assunto principal era a nossa ida ao continente no mês seguinte. A artista apontava todos os lugares aos quais pretendia nos levar e explicava como eu deveria agir em sua casa. Eu as escutava e registrava suas palavras. Entretanto, ainda estava entregue as sensações deliciosas de ter a mulher amada em meus braços.

Depois de muito discorrer sobre a visita, nossa amiga sugeriu a construção de um castelo na areia. Ajudamos na execução e foram muito divertidos aqueles momentos de cooperação. Contudo, ao terminamos a chuva começou a cair torrencialmente. Ella se levantou e comentou estar na hora de voltarmos.

O tempo estava inconstante naquele dia. A chuva cessou quando começamos nosso caminho de volta e em seguida o sol se abriu. As duas caminhavam animadas a minha frente, comentando o quanto estavam famintas e sobre qual seria o prato do dia.

Logo ao chegarmos, Eve nos ensinou a fazer sushi. Após cozinharmos o arroz no vinagre, o distribuímos sobre uma alga ressecada chamada nori. Colocamos o recheio de peixes, legumes ou frutas sobre a base de arroz e alga. Por fim enrolamos e cortamos em pequenas fatias.

Terminamos a confecção da refeição junto com o crepúsculo. A artista fez questão de nos servir. Enquanto colocava o prato a minha frente, falou em um sussurro encoberto por um sorriso:

– Ella está radiante hoje, acho que é um “efeito robozinho”! – Eu estava acostumado as suas tiradas rápidas e zombeteiras. Apenas continuei sorrindo, sabendo não haver motivo algum para retrucar.

A animação da minha criadora durante todo o jantar nos garantiu muita alegria. Sorria para mim abertamente, sem ruborizar ou desviar o olhar. Nossa amiga sugeriu nos vestirmos apropriadamente para uma noite de festa e comemoração. Sua concordância e contentamento com a sugestão nos contagiaram.

Eve separou algumas roupas para mim. Pegou uma de suas malas e as duas sumiram dentro do banheiro por uma hora, doze minutos e treze segundos. Esperei por elas sentado no balanço da varanda, logo após me trocar. Relembrava o incrível interlúdio na praia, com a mulher amada relaxada sobre meu ombro. Precisava compreender o significado de sua rendição, estava esperançoso de conquistar o seu amor.

Ouvi o som de seus passos, quando as duas passaram pela porta e me virei. Ella estava deslumbrante, seu rosto suavemente maquiado como eu nunca vi antes. Embora a preferisse ao natural, admiti o magnífico resultado de sua produção.

Estava admirado com a sua beleza realçada pelas roupas tão reveladoras e sedutoras quanto o seu biquíni. Aprendi em minhas leituras, sobre algumas mulheres se vestirem de forma provocante para seduzirem seus parceiros. Necessitava saber se eu era a causa de todo o seu cuidado com a aparência.

Não tive tempo de pronunciar elogio algum. Ao me levantar, Eve preencheu três taças com champanhe e as distribuiu entre nós, fazendo um rápido brinde:

– Ao robozinho que cativou nossa amizade e conquistou o direito de ser chamado de Adam. Graças ao seu novo visual sexy e humano. – Brindamos e rimos do jeito irônico da artista me elogiar.

Após esvaziarmos a garrafa de champanhe, as duas insistiram para dançarmos. Um antigo gramofone, foi transformado por minha criadora em um moderno leitor de CDs e DVDs. Nós nos reunimos a sua volta e nos movimentamos ao som da música eletrônica.

Dancei de frente para Ella admirando a fluidez de seus gestos, a facilidade com a qual acompanhava o ritmo da música. Todavia, meu maior encantamento era receber seus olhares e sorrisos durante todo o tempo. Havia lido sobre flertes e estava claro, aquilo só podia ser um.

Quando a música ficou lenta, resolvi arriscar-me, a trouxe de encontro ao corpo, sob o olhar e aprovação de nossa amiga. A mulher amada se deixou enlaçar deslizando suas mãos pelas minhas costas. Embora a dança fizesse parte da antiga programação do meu antecessor, pela primeira vez eu a segurava junto ao meu corpo com esta intenção.

Era algo fascinante deslocar meus pés lentamente pelo assoalho da varanda, a conduzindo junto a mim. Podia ouvir sua respiração ofegante, sentir seu perfume suave e me deleitar com o contato do seu quadril se movimentando de encontro ao meu. As nuvens brincaram de esconder com o sol naquele dia. Entretanto, para mim o dia foi resplandecente e incomparável: Um verdadeiro dia de sol.